Miscelânea

11:52:00



A única forma que encontro para libertar minha alma e minha mente é escrevendo, aqui não tem empecilhos, não tenho medo, não tenho pudores e, de certo modo, nem mesmo censura. As palavras são, na minha vida, como asas que me levam aos lugares mais inusitados e aos pontos mais criativos da minha mente. Chego ao cume mais alto e me atiro de lá para o abismo fundo dos meus pensamentos, sem nenhum tipo de medo ou de receio, me jogo. Essas viagens são tão intensas e libertadoras que acabo paradoxalmente ficando presa ao vício de escrever, cada vez mais crio universos de ideias pelos quais navegar, quase não dou conta de tanta dúvida. Sim, o que me liberta é o que mais me prende -  isso me lembra muito o amor. O amor, óh o amor - seja o amor suicida shakespereano ou bíblico, não importa, o que me intriga mesmo é o verdadeiro amor.

O amor é uma dessas coisas pelas quais anseio tanto poder escrever, mesmo que seja clichê; o amor líquido, flúido e fugaz se tornou comum, quase lei, e as pessoas se acostumaram a não se permitir, a se contentar com meios termos, com casamentos de um mês - não que o tempo determine muita coisa, contudo, os fatos e as razões revelam que nesse caso o fator tempo se coaduna com a intensidade do sentimento. Concordo muito com quem dizia "Não me venha com meios-termos", amor que se dê ao respeito é visceral, enlouquecedor, libertador e viciante, tanto quanto não existe mais. A dor faz parte do amor, por isso todos os poetas que já amaram, sofreram e são tenros e intensos ao mesmo tempo. O amor dói na saudade, no cíume, no medo, na necessidade, na decepção, na alegria que não cabe no peito, no começo, no fim e na própria dor é quando mais dói. Dor é, também, algo que me desperta muitas ideias, ainda dentro do viés 'dor de amor', gostaria de compartilhar uma observação que sempre me intrigou e que flagrei em uma crônica de C.F. Abreu que li recentemente, a dor da perda dói muito, quando alguém que amamos morre é totalmente devastador, contudo essa dor dói muito também quando simplesmente perdemos essa pessoa para a própria vida, ela não morreu só não nos quer mais, poderíamos estar com ela, mas não estamos, é, talvez, mais irremediável que a própria morte. Na morte ainda se pode imaginar que a pessoa está de algum modo ao seu lado, que a ligação não se cortou pela morte, mas quando a ligação se parte antes da morte é fatal, mais letal que a própria morte (desculpe dona morte, sou uma pobre que pensa demais não me venha tirar satisfações). Como disse Joana, personagem brilhante de Clarice: " ... a eternidade é o não ser, a morte é imortalidade." - em Perto do Coração Selvagem.

Outro fato que muito me intriga e muito me entristece são as pessoas pobres de alma que se contentam em ser que querem que elas sejam e nunca buscam ser o que querem ser, são qualquer coisa, menos o que querem ser de verdade, querem qualquer coisa menos ser o que são. Essas que vivem anos sem ser nada, comum, normal, mais um número, uma estatística, um eleitor, um cidadão. Se eu puder escolher - e posso - prefiro fazer parte do clube dos 27 do que do clube dos centenários, por que entre viver mais e viver eternamente, sempre prefiro a viver mais, sempre a intensidade, prefiro pecar pelo exagero como o garoto Cazuza e a menina Amy. Esses dias, ouvi uma frase muito boa, desconheço o autor, "Eternamente é ter na mente", make sense, ter na mente e no coração.
Eu queria muito escrever um conto com sonhos em que o amado sonhava que a amada sonhava com ele, ou será o contrário? Enfim, esse conto ia falar de prisão e liberdade, de estar preso em um sonho e que em um sonho somos totalmente livres, que é parecido com o amar, estar preso em um sonho em que se é totalmente livre para sentir, ou não - não sei bem, a ideia ainda está meio confusa, mas a ideia é essa. A liberdade sempre se torna privação, se sou livre para amar me prendo no amor, se sou livre para ser livre me prendo na tentativa se cada vez mais livre, acho que entendo por que Clarice Lispector dizia que a liberdade era pouco, que o que ela desejava ainda não tinha nome, é Clarice, ainda não tem.

As dúvidas do viver é o que me faz viver, o fato de que não há nada que escape à transfiguração torna isso um looping infinito. São tantos os assuntos sobre os quais quero escrever, talvez eu os escreva, cada um deles, ou não - como diria Walter Franco - talvez eu perca o interesse depois de tê-los citado aqui, ou talvez, ainda, eu já tenha escrito sobre eles aqui e não percebi. O segredo só tem graça antes de revelado e agora é tarde, afinal você já leu até aqui.

A minha sede de escrever não passa, aumenta, estou presa a ela; garganta seca e alma inundada. Um oceano de palavras, um mar de pensamentos, um rio de temas, uma nascente de inspiração, uma fonte de desabafo e uma gota de tempo. Miscelânea literária. Pode ser ainda turbilhão, furacão, faça uso da metáfora que quiser, Caio Fernando usaria a palavra voragem, já Clarice, doce, usaria liberdade.


" ... sentia que essa estranha liberdade que fora sua maldição, que nunca a ligara nem a si própria, essa liberdade é o que iluminava a sua matéria ... " Clarice Lispector

Beijos, Jeh. 

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